A possibilidade de celebrar Acordos Prévios sobre Preços de Transferência (adiante apenas APPT), prática sobejamente conhecida noutras jurisdições onde está, já, muito enraizada, foi recentemente introduzida em Portugal encontrando-se prevista no artigo 128º-A do CIRC e na Portaria n.º 620-A/2008 de 16 de Julho.
Com a sua introdução e regulamentação, permite-se que as empresas comuniquem à Administração Fiscal o seu interesse em celebrar um APPT, onde se irá acordar, a priori, a metodologia a utilizar na fixação do preço nas transacções realizadas com entidades relacionadas, evitando, por esta via, posteriores ajustes ou correcções da matéria colectável por parte da Administração Fiscal, que já aceitou, previamente, o método ou métodos para determinar a matéria colectável em operações vinculadas de acordo com o princípio da livre concorrência.
Estes acordos revelam-se, assim, um factor de maior competitividade e de segurança para os contribuintes e até para a própria administração fiscal, porquanto introduzem uma maior transparência no sistema fiscal, tornando mais previsível o regime de operações internacionais.
Os APPT poderão versar sobre a totalidade ou parte das operações da empresa e poderão ser unilaterais, quando celebrados com uma única Administração Fiscal e um contribuinte (DGCI e um contribuinte de IRS ou IRC), ou multilaterais, quando, alem de celebrados com a DGCI, sejam celebrados com outra ou outras Administrações Fiscais no âmbito do procedimento amigável previsto em Convenção para evitar a dupla tributação nos impostos sobre o rendimento.
Na Região Autónoma da Madeira, o processo de celebração de um APPT, segue os mesmos trâmites que um APPT celebrado no demais território português, estando sujeito aos mesmos requisitos, forma e prazos que constam da Portaria. Contudo, atenta a descentralização tributária que se verificou em 2005, a proposta de acordo deverá ser endereçada, não ao Director Geral de Contribuições e Impostos, conforme o prevê a portaria, mas sim ao Director Regional dos Assuntos Fiscais, que é na RAM a entidade competente.
Com efeito, com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 18/2005, de 18 de Janeiro, acto legislativo pioneiro da descentralização tributária portuguesa, foram transferidas para a Região Autónoma da Madeira as atribuições e competências fiscais que no âmbito da Direcção de Finanças da Região Autónoma da Madeira e de todos os serviços dela dependentes vinham sendo exercidas no território da Região pelo Governo da República.
Fruto desta descentralização tributária, criou-se na RAM a Direcção Regional dos Assuntos Fiscais, DRAF, que passou a ser a entidade competente para o exercício destas matérias e que funcionaria de forma articulada, mas autónoma e independente da Direcção Geral de Contribuições e Impostos.
Nos termos do Decreto Regulamentar Regional 29-A/2005/M de 31 de Agos-to, que define e explicita as funções, atribuições e competências da DRAF, dispõem-se que a mesma tem por missão, não só assegurar e administrar os impostos sobre o rendimento, sobre a despesa e sobre o património e de ou-tros tributos legalmente previstos, como também executar as políticas e as orientações fiscais definidas pelo Governo Regional em matéria tributária a exercer no âmbito da RAM, sem prejuízo do disposto nos artigos 140.º e 141.º da Lei n.º 130/99, de 21 de Agosto, a administração, lançamento, liquidação e cobrança dos impostos que constituem receita da Região e zelar pela aplicação e cumprimento da demais legislação em matéria fiscal nacional.
Mais se dispõem que, no exercício das competências que lhe foram atribuídas, a DRAF deverá pautar-se pelos princípios da isenção, independência e obediência rigorosa às regras de confidencialidade legalmente previstas e à unidade do sistema fiscal, funcionando de forma articulada e coordenada com a Direcção Geral de Impostos, mas sendo dela autónoma e independente.
Nestes termos, um APPT a outorgar por uma empresa instalada na RAM ou no CINM, será proposto, discutido, negociado e aceite junto à Direcção Regional dos Assuntos Fiscais, que, no exercício das suas funções e atribuições, é na RAM a entidade competente.
O processo inicia-se com a sujeição da proposta de acordo à Direcção Regional dos Assuntos Fiscais que a deverá apreciar preliminarmente nos 60 dias subsequentes à sua apresentação. Dentro desse prazo, a Direcção Regional dos assuntos Fiscais poderá pronunciar-se logo ou fazer uso da totalidade do prazo fixado quando e se a complexidade da proposta assim o exigir. Quando a proposta não revelar especial complexidade, a Direcção Regional dos Assuntos fiscais pronunciar-se-á, diligentemente, sobre a mesma, podendo, assim, o contribuinte interessado apresentar, desde logo, o seu projecto de APPT, devidamente instruído com todos os dados e documentos exigidos pela Portaria. Caso contrário, só o poderá fazer passados 60 dias sobre a apresentação dessa proposta.
Uma vez recebido este requerimento, inicia-se, então, o processo de celebração de um APPT que passará, pelo menos, por quatro fases: fase preliminar, proposta de acordo, avaliação e negociação com a administração fiscal de outros estados, caso o acordo seja multilateral e celebração do acordo.
De acordo com a Portaria, estes acordos não podem ser celebrados por prazo superior a três anos, contudo admite-se a sua a renovação desde que o interessado o requeira no prazo de seis meses antes do termino do prazo de vigência.
Sendo celebrado o acordo e sendo respeitadas as condições nele fixadas, o preço praticado já não poderá, à partida, ser revisto, o que conduz a uma maior estabilidade nas operações realizadas pelas empresas, proporcionando uma, muito desejada, segurança fiscal.
O recurso aos APPT, afigura-se, assim, como um mecanismo eficiente para o contribuinte defender o seu ponto de vista nesta matéria, sem estar numa fase pré-contenciosa ou contenciosa com a Administração Fiscal à qual também será exigida uma atitude proactiva e cooperante.